25 de dezembro: Solenidade do Natal | Paulus Editora

O Domingo – Palavra
25 de dezembro: Solenidade do Natal

O OLHAR DE DOQUINHA

Só sabe o valor da luz quem já enfrentou a escuridão. Doquinha sabia. Nasceu sob a luz de lamparina a querosene. Naquela noite a parteira do lugar, já com a vista cansada e as mãos trêmulas, quase não enxergou seu cordão umbilical. Cortou-o certinho, porque experiente. Pegou dezenas de pequeninos em suas mãos, fosse noite, fosse dia. Enquanto Doquinha ecoava o seu primeiro choro, lá fora o galo entoava o seu canto.

Nem sabia, mas com seu nascimento toda a humanidade estava ganhando. Toda a criação se beneficiando. Cada vida nova que vem ao mundo traz consigo ganhos para toda a criação. Doquinha nasceu saudável. O pai, ao entrar no pequeno quarto – já iluminado pela luz dos primeiros raios de sol – e vê-la deitadinha na rede, na paz que só os anjos têm, disse: “Menina bonita do pai, que graúda! Deve pesar uns três quilos”. A mãe sorriu, concordando.

Deram-lhe o nome de Raimunda. Porém sempre a chamaram de Doquinha. Como menina do mato, aprendeu desde cedo a amar a natureza. Ficava encantada com as formigas carregando folhas maiores do que elas. Sabia o nome dos pássaros e de longe os identificava pelo canto: acauã, araponga, bem-te-vi, canário, cancão, carão, cabeça-vermelha, ema, juriti, nambu, patativa, sabiá, socó, xexéu… Sempre teve medo do carcará. Viu-o muitas vezes assustando as galinhas do terreiro e ficava aflita quando ele carregava nas garras algum pintinho. Até chorava de pena ao ver o bichinho sendo levado para as alturas.

Doquinha ficou moça e teve o mesmo destino da avó, da mãe, das tias, das vizinhas. Casou-se nova e encheu a casa de filhos. Para criá-los, enfrentou muita precisão. Devota de Nossa Senhora do Bom Parto e de são Francisco, jamais perdeu a fé e a esperança. Amor sempre teve de sobra. Filhos dão trabalho. Mãe dá amor. Foi sempre isso o que fez Doquinha. Também jamais se recusou a ajudar a quem precisasse. Mesmo com a luta de casa e da roça, que não era pouca, percorria distância a pé para visitar os doentes, isso quando não fazia uma visita amistosa para um dedo de prosa.

Já idosa e doente, nunca foi de lamentar. Prestes a morrer, ficou sabendo que a energia elétrica chegaria ao sítio. Não acreditou. Ouvira muitas promessas de políticos enganadores. O programa Luz para Todos chegou às vésperas de sua páscoa. Doquinha enxergava quase nada.

Antes de partir, seus olhos, da cor do céu do sertão sem nuvens, iluminaram a todos. Não há como se esquecer desse olhar nem da vida inteira de Doquinha, iluminada pelo amor.

Pe. Antonio Iraildo Alves de Brito, ssp


O Domingo – Palavra

O objetivo deste periódico é celebrar a presença de Deus na caminhada do povo e servir às comunidades eclesiais na preparação e realização da Liturgia da Palavra. Ele contém as leituras litúrgicas de cada domingo, proposta de reflexão, cantos do Hinário litúrgico da CNBB e um artigo que trata da liturgia do dia ou de algum acontecimento eclesial.

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