Falar com o coração: o apelo do Papa Francisco | Paulus Editora

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Igreja e Sociedade

26/05/2023

Falar com o coração: o apelo do Papa Francisco

Por Érika Augusto

“O fruto mostra o cultivo da árvore, assim a palavra do homem, os pensamentos do seu coração” (Eclo 27, 6)

Em maio, a Igreja Católica celebra o “Dia Mundial das Comunicações Sociais”. A data surge a partir do decreto Inter Mirifica – sobre os meios de comunicação social, publicado em 4 de dezembro de 1963. No capítulo II, número 18, o então papa São Paulo VI convoca toda a Igreja a celebrar esta data. Em 1967 comemora-se pela primeira vez o “Dia Mundial das Comunicações Sociais”, sempre no domingo da Ascensão do Senhor. Para marcar a data, anualmente o Santo Padre divulga uma mensagem voltada a todo povo de Deus. Neste ano, o tema escolhido foi “Falar com o coração. Testemunhando a verdade no amor”, inspirada na Carta aos Efésios (4,15). De acordo com o Pontífice, “para se poder comunicar testemunhando a verdade no amor, é preciso purificar o próprio coração”.

Ao propor uma comunicação que parta do coração, o papa Francisco não convida os cristãos a um mero sentimentalismo. Para ele, devemos estar em contato com o outro a partir do nosso íntimo, para que sintonizados na mesma frequência, possamos “sentir no próprio coração também o pulsar do outro”. Falar com o coração significa comunicar-se de forma autêntica, sincera, responsável e emocionalmente envolvida, de modo a expressar verdadeiramente quem somos e o que sentimos, estabelecendo uma conexão profunda conosco e com o próximo, através de um elo significativo e genuíno.

Em sua colação VII, João Cassiano (360-435), monge e teólogo cristão do período patrístico, resume que a perfeita bem-aventurança acontecerá quando “aquele perfeito amor de Deus, com o qual Ele nos amou primeiro (1Jo 4, 10), passar também para o afeto do nosso coração, pela realização da oração do Senhor, a qual acreditamos que de modo nenhum pode ser anulada”. Ou seja, assim como no apelo do papa Francisco, também a oração deve estar ligada ao nosso coração. Para o monge, quando tudo em nós estiver em unidade com o Pai, “a tal modo unidos a Ele que o que respiramos, o que compreendemos, o que falamos seja de Deus”, completa. 

Diante de um cenário em que muito se comunica (e por muitos meios), percebemos o quanto a mensagem tem se tornado estéril. Na vida e nas redes, fala-se muitas vezes por falar. Nos comentários das redes sociais, percebemos a necessidade do ser humano em exprimir sua opinião, sem preocupar-se em contextualizar a situação. Nestes casos, é necessário o exercício da empatia, colocar-se no lugar do outro. E, muitas vezes, perceber quando nosso silêncio torna-se necessário. Não um silêncio punitivista e indiferente, usado para castigar o outro, mas um silêncio que acolhe e ressignifica a mensagem.

Em sua obra “Minutos de resiliência: para viver com sentido”, no capítulo “Sequestradores da alma”, o autor Pe. Francisco Galvão, ssp, fala sobre esta questão: “Numa época em que tudo está sendo dito e publicado sem crivo algum, faz falta a discrição que tudo pondera. Revele apenas o essencial à sua edificação e a dos outros; o resto pertence apenas a você”. E finaliza: “Cultivar o silêncio é uma arte necessária, e é preciso nobreza de alma para praticá-la na hora devida”.

Em 2014, na mensagem para o “48º Dia Mundial das Comunicações Sociais”, o papa Francisco orientava para a promoção de uma comunicação a serviço da cultura do encontro. No texto, o Pontífice recorda que os meios de comunicação devem aproximar as pessoas, num “renovado sentido de unidade da família humana”. Segundo ele, esta proximidade deve suscitar gestos concretos, como a solidariedade, a promoção de uma vida digna e a unidade. “Os muros que nos dividem só podem ser superados se estivermos prontos a ouvir e a aprender uns dos outros”, aconselha o Santo Padre. 

Por isso, o papel do cristão é tornar a palavra fecunda, para que ela produza muitos frutos, como alegria, paz, gratidão, consolo. Através da prática do silêncio, ponderemos nossas palavras e façamos um exercício interior de escuta para extrair o melhor de nós e, respectivamente, transmitir a mensagem ao próximo. Falar com o coração é estar em sintonia verdadeira com nosso interlocutor e conosco mesmos. No exercício de comunicar, é essencial praticar a escuta e o silêncio, a fim de discernir quando a nossa palavra se torna símbolo de união ou divisão.

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