Os desafios dos profissionais do SUAS frente à demanda da população LGBTQIA+

Autores: Barbara Simões da Silva, Débora Campos Doretto, Mariana Caroline da Silva Pinto

O presente trabalho é fruto de um estudo referente à população LGBTQIA + e tem como foco o processo de qualificação e capacitação do profissional que atua junto ao Sistema Único de Assistência Social – SUAS. Os resultados obtidos reforçam a hipótese inicial de que uma formação que embasa a atuação fortalece uma conduta ética e inclusiva. As violações aos direitos afetam todos os aspectos da vida social do sujeito que destoa da heteronormatividade. Sua permanência na escola é desencorajada por agressões institucionais e seu acesso ao mercado de trabalho é reservado a determinadas profissões informais. A saúde torna-se um mecanismo de controle e seu acesso à cidade é criminalizado. Tendo suas existências barradas nesses espaços de convivência comunitária, tornam-se frágeis os vínculos e mais suscetíveis às adversidades. Este estudo possui caráter exploratório, descritivo e bibliográfico. Para a realização da pesquisa de campo, foi elaborado um questionário on- -line semi-estruturado. A coleta de dados se deu através da distribuição de link para preenchimento do formulário eletrônico, obtendo adesão espontânea de 35 pessoas de diferentes municípios e estados.

Este artigo está fundamentado em uma pesquisa on-line, aplicada via formulário, direcionada a profissionais que atuam no Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Os resultados foram divididos em três eixos: Perfil, Formação e Capacitação Profissional e Desafios da Atuação. Dos entrevistados, a maioria atua na Política de Assistência Social, sendo: 23,5% na Proteção Básica, 35,3% na Proteção Especial de Média Complexidade e 14,7% na Proteção Especial de Alta Complexidade. A porcentagem dos que atuam no SUAS é de 85,3%.

Também podemos constatar que há uma variação de período de atuação no SUAS, onde a maior parcela declarou atuar entre 6 e 10 anos, o que caracteriza profissionais com maior grau de experiência.

EIXO II: FORMAÇÃO E CAPACITAÇÃO PROFISSIONAL

Esta pesquisa abordou profissionais dos diferentes níveis de atuação para compreender o processo de formação e qualificação profissional. 

Como podemos observar no gráfico acima – apenas 8.8% tiveram a discussão de gênero como uma disciplina na grade curricular do processo de formação superior. Em um segundo momento os entrevistados foram questionados sobre o processo de qualificação profissional após inserção dos equipamentos da Política de Assistência Social, conforme segue:

Os entrevistados que já passaram por processo formativo foram abordados em relação a esse impacto frente à atuação profissional, considerando a escala de 0 a 10. Diante da ausência dessas discussões:

A partir desses dados, os maiores desafios elencados são: 

a) Necessidade de capacitação profissional;

b) Aprofundamento na temática; 

c) Falta de informação.

EIXO III: DESAFIOS DA ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS

A diversidade da sexualidade e do gênero provoca uma quebra de paradigmas sociais. Os profissionais do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que atuam com as mais variadas expressões da questão social, estão aptos a abrir mão de seus próprios preconceitos? A Política Nacional de Assistência Social traz em seu texto uma referência específica para o atendimento a esta população:

Constitui o público usuário da política de Assistência Social, cidadãos e grupos que se encontram em situações de vulnerabilidade e riscos, tais como: famílias e indivíduos com perda ou fragilidade de vínculos de afetividade, pertencimento e sociabilidade; ciclos de vida; identidades estigmatizadas em termos étnico, cultural e sexual; desvantagem pessoal resultante de deficiências; exclusão pela pobreza e, ou, no acesso às demais políticas públicas; uso de substâncias psicoativas; diferentes formas de violência advinda do núcleo familiar, grupos e indivíduos; inserção precária ou não inserção no mercado de trabalho formal e informal; estratégias e alternativas diferenciadas de sobrevivência que podem representar risco pessoal e social (BRASIL, 2004, p. 27, Grifo nosso).

As dificuldades são variadas, e se materializam através da invisibilidade dos dados, falta de ações assertivas, espaço físico adequado, fluxos de atendimentos estabelecidos e fortalecimento da rede de serviços. Podemos ver alguns destes pontos destacados pelos participantes da pesquisa:

Não ter uma Rede para Atendimento especializado da demanda. 

(E12 – Assistente Social, 40 anos.). 

Espaço físico que de fato se sinta confortável e acolhido (a). 

(E23 – Assistente Social, 42 anos.). 

Profissionais principalmente na saúde e educação que acolham as demandas. Bem com a inserção no mercado de trabalho 

(E24 – Assistente Social, 42 anos.). 

Acessibilidade, respeito, políticas públicas de proteção. 

(E15 – Assistente Social, 43 anos) 

Poucos lugares para encaminhamento; muito preconceito da sociedade. 

(E29 – Assistente Social, 37 anos.). 

Empregabilidade; Inclusão social. 

(E34 – Assistente Social, 27 anos.).

Outro problema identificado foi a elaboração dos formulários de atendimentos, pois não englobam a diversidade sexual e não garantem o uso do nome social. Outro quesito abordado na pesquisa foi sobre os banheiros dos locais de atuação. Indagamos se os banheiros são genderizados (separados por gênero) ou unissex. Verificou-se que somente em locais de baixo atendimento ao público têm banheiros unissex.

Frente aos desafios identificados, faz-se importante destacar a Resolução Conjunta do Conselho Nacional de Combate a Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – CNCD/LGBT e o Conselho Nacional de Assistência Social–CNAS nº 1, de 21 de setembro de 2018, que estabelece parâmetros visando a qualificação do atendimento para o população LGBTQIA+.

Art. 1º A rede socioassistencial do Sistema Único de Assistência Social – SUAS deve atuar de forma articulada para a promoção de atendimento qualificado ampliando acesso aos serviços e programas socioassistenciais para a população LGBT. 

Art. 2º A rede socioassistencial deverá garantir no âmbito de todos os níveis de proteção social o reconhecimento e a adoção do nome social mediante solicitação da/do interessado/a. 

Art. 3º A garantia do reconhecimento da identidade de gênero deve ser estendida também para crianças e adolescentes, em diálogo com os responsáveis. 

Art. 4º A rede socioassistencial deve garantir o uso de banheiros, vestiários, alojamentos e demais espaços segregados por gênero, quando houver, de acordo com a identidade de gênero de cada usuária/o.

O SUAS, por sua vez, lançou a Campanha “SUAS sem transfobia”, que se tornou referência para a luta e a busca das garantias de direitos.

O Trabalho Social com Famílias no SUAS visa à prevenção e atendimento de situações de violência e violações de direitos. É imprescindível que as unidades do SUAS enquanto garantidores de direitos respeitem as identidades de gênero e a orientação sexual das/os suas/seus usuárias/os, proporcionando a liberdade e individualidade no uso dos espaços, incorporando modos de tratamento e especificidades no acompanhamento socioassistencial, fortalecendo a autonomia e cidadania desta população. (BRASIL, 2018 – SUAS Sem Transfobia).

A busca pela compreensão da realidade da popula – ção LGBTQIA + deve ser contínua para que haja sucesso em ações de enfrentamento a violência e garantia de direitos. Este estudo possibilitou maior aproximação com o serviço oferecido à população LGBTQIA + e os desafios para um atendimento de qualidade e livre de preconceitos. Para que o profissional que está à frente da demanda realize o atendimento e os encaminhamentos necessários deve-se conhecer a rede de serviços, programas e projetos disponíveis. Além disso, é importante ter proximidade com o tema, garantindo assim um atendimento acolhedor. Ressaltamos a importância de mecanismos de estudos e capacitação sobre as temáticas relacionadas às minorias. O processo de capacitação profissional não garante apenas a qualificação profissional como preconiza a Política Nacional de Educação Permanente. Através do aprimoramento no acompanhamento e elaboração de estratégias assertivas, pode haver contribuição ativa para o rompimento dos ciclos de violência. Esse processo traz como elemento indissociável a participação popular, onde os assistidos são protagonistas dessa construção. Depois de colocadas em prática, são necessários mecanismos de monitoramento e avaliação que possam comprovar sua eficácia. Esse processo é um comprometimento com a elaboração de uma práxis verdadeiramente humana, honrando assim, o compromisso ético assumido pelos profissionais do SUAS.

*As referências bibliográficas podem ser lidas no trabalho completo. 

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