Hoje, amanhã e depois

Autores: Pedro Figueiredo, Ana Santos

O debate sobre a família contemporânea e a busca por conhecer suas particularidades durante a pandemia orienta o círculo formativo do tema “Família”. Se antes uma família era considerada como tal apenas pelos laços sanguíneos e de casamento, hoje ela é entendida também pelos laços afetivos, um grande avanço. As mudanças também afetaram as mulheres, que deixaram de ser “propriedade” dos maridos e passaram a ser compreendidas como sujeitos de direitos. 

Novos conceitos de família são retratados em produções culturais como séries, novelas, filmes, peças, livros… Diversas histórias e roteiros mostram que as mulheres podem pedir a separação do marido, que pessoas divorciadas e com filhos podem casar novamente, que casais homoafetivos podem constituir uma família e que outros estereótipos sólidos já estão fora de moda.

E POR QUE FALAR DO HISTÓRICO DAS FAMÍLIAS?

Aos profissionais da Assistência Social, da Educação, da Saúde e de outras áreas que lidam com famílias diariamente, é essencial uma compreensão ampla do conceito de família, bem como o conhecimento sobre o percurso histórico de lutas e conquistas responsáveis por suas mudanças. Como abordam Freud e Lacan, é na família que cada pessoa se constitui como indivíduo, a partir das experiências que passa. Mas com tantas famílias diferentes e de configurações tão variadas, é necessário entender do que se fala quando se fala de família. Igualmente relevante a tais profissionais é debater sobre o atendimento às famílias. Na atual conjuntura, esse debate gira em torno do acesso às famílias durante a pandemia. É importante refletir sobre o que fazer nesse período de atendimento remoto, como entrar em contato com pessoas que não estão conectadas à internet, que não conseguem acessar vídeos e conteúdos em tempo real. 

O atendimento a uma família começa assim que ela chega à instituição. Quais são suas expectativas? O que conhecem e ouviram falar? Acolher as demandas é um dos trabalhos mais importantes e difíceis de serem feitos, afinal, são muitas famílias diferentes, não apenas em configuração, mas em vivências, necessidades, expectativas e maneiras de lidar com o outro. É preciso ter tolerância, saber falar e ouvir, ter empatia e, tão importante quanto outros pontos, ter respeito pelas diferenças. Cada pessoa tem seu jeito, seu temperamento, sua velocidade, sua história; entender e respeitar isso são pontos fundamentais para a convivência humana.

E COMO SERÁ O MUNDO APÓS ESTA PANDEMIA?

Em conversas sobre diversos cenários pós-pandemia surgem ideias, sugestões e angústias sobre como será o mundo e como serão os atendimentos. Será que as pessoas poderão voltar a ter contato físico? Como serão as adaptações à nova realidade? E a saúde mental dos profissionais, como ficará? 

Perguntas pertinentes, mas, por ora, sem muitas respostas concretas. Apesar de diversas conjecturas e hipóteses, a realidade é que ninguém sabe ainda como será. Então, por que falar sobre isso? 

Neste momento entra em cena o planejamento. Discutir as mudanças após entender a realidade atual é vital para que sejam feitas adaptações para os cenários pós-pandemia. Quem deixou o trabalho presencial foi pego de surpresa, tendo de se adaptar à vida de atendimento remoto, aos contatos apenas por telefone, mensagens e outros meios digitais, à permanência quase integral em casa, tudo enquanto mantém o serviço acontecendo. A importância de se discutir o futuro é justamente organizar ambientes, rotinas e procedimentos para que o retorno ao trabalho presencial não seja tão impactante quanto foi a saída para o trabalho remoto. 

A partir dessas discussões conceituais, foram criadas duas oficinas diferentes para os participantes do grupo de formação com o tema “Família”: uma delas discutiu e criou um protocolo de retorno seguro aos atendimentos presenciais, enquanto a outra elaborou uma pesquisa em âmbito nacional com famílias sobre suas percepções e sentimentos. 

O protocolo de retorno às atividades é um documento que serve como orientação para organização do espaço físico, da equipe, das rotinas e da comunicação para que a retomada das atividades presenciais seja a mais segura possível. O documento foi elaborado observando possibilidades de adaptação que atendam às demandas das diferentes instituições e territórios, ou seja, não é algo fechado e que deva ser seguido à risca. O grupo trabalhou para contemplar diferentes pontos e necessidades de diferentes áreas, tipos de serviço, tipos de rotinas e municípios brasileiros. 

Concomitantemente à elaboração do protocolo aconteciam as reuniões do grupo da pesquisa, que surgiu da preocupação com os impactos pré- -existentes e que foram intensificados pela crise pandêmica vivida em 2020. O objetivo era obter informações sobre como estavam vivendo as famílias diante do cenário atual, altamente delicado em termos políticos, econômicos e sociais. Foi um projeto bastante ousado e inovador, já que as informações específicas deste momento de pandemia ainda não haviam sido colhidas, mas os resultados foram satisfatórios, revelando os pontos de maior necessidade de atuação e aperfeiçoamento dos trabalhadores da Assistência Social, da Educação, da Saúde e de outras áreas. 

Considerando três eixos temáticos – convivência, situação socioeconômica e perspectivas futuras – foram feitas a criação e a escolha de cinco perguntas para cada eixo, a elaboração do questionário, a testagem da pesquisa, a aplicação real do questionário e a análise de dados. Foram necessários engajamento e participação para que o processo fosse concluído e, com menos de dez dias de aplicação, foram obtidas mais de 600 respostas de famílias das cinco regiões do Brasil. 

O maior índice de respostas veio do Sudeste, com 65% (369 respostas), seguido pelo Nordeste, com 21% das respostas (122 respostas). Verificou-se que 64% dessas famílias são atendidas por alguma organização social. Quanto à participação dessas famílias no Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (organização social) neste momento de pandemia, 62% relataram que fez muita diferença, 17% não souberam responder e apenas 5% relataram que não fez diferença. 

No eixo “A convivência familiar e comunitária na pandemia”, em relação às dificuldades encontradas pelo grupo familiar no isolamento social, 41% das respostas relataram desemprego/diminuição da renda, 27% não relataram dificuldades e 19% indicaram questões emocionais ou questões de saúde mental/psicológicas. 

No eixo “A situação socioeconômica da família”, 51% das famílias indicaram a necessidade de receber auxílios que não recebiam antes, 19% já recebiam, 18% não precisaram e 7% precisaram e não foram contempladas. 

Quanto ao emprego, 41% relataram situação de desemprego desde antes do início da pandemia, 16% continuaram trabalhando presencialmente, 16% estavam trabalhando e foram desligados, 15% passaram a trabalhar em casa e 8% trabalharam parcialmente em casa e parcialmente fora. 

Por fim, no eixo “Perspectivas de futuro pós-pandemia”, sobre o diálogo familiar a respeito desse tema: 41% dialogam, mas não sabem direito o que fazer; 39% dialogam e relataram que já é bom se preparar para o futuro; 11% não dialogaram e 6% não dialogaram por achar que ainda é cedo. 

O resultado final foi positivo e algumas instituições utilizaram a pesquisa como atividade interna, favorecendo o fortalecimento de vínculos com a família. A continuidade da pesquisa pode auxiliar as atividades futuras do serviço. 

A ideia é que o documento também contribua para que as organizações sociais possam elaborar o Plano de Retomada das Atividades Presenciais, considerando a avaliação epidemiológica de cada município, bem como a rede setorial e intersetorial. 

O protocolo ainda será adaptado e colocado em prática por muitos trabalhadores e usuários do SUAS, enquanto a pesquisa com as famílias permanecerá sendo aplicada em 2021.

Tema: Família Participantes: 128 

Municípios: 67 

Instituições públicas e privadas: 89 

Encontros virtuais entre agosto e novembro de 2020: 10 

Principais resultados: pesquisa sobre situação familiar na pandemia e protocolo de retomada às atividades presenciais.

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